Enquanto a empresa Brasil Bio Fuels (BBF) nega qualquer participação no episódio sangrento e indígenas e comunidades quilombolas da região entre o Acará e Tomé-Açu acusam-na de ser a responsável pela emboscada que resultou em um morto e três feridos, ontem, o clima na região é de medo. O governador Helder Barbalho, em campanha pela reeleição, ainda não soltou nenhuma palavra sobre o episódio sangrento.
Paira no ar, segundo fontes ouvidas pelo Ver-o-Fato, novas ameaças de morte e revide contra as comunidades que há muitas décadas ocupam as terras de onde estão sendo ameaçadas de expulsão. Um barracão cultural, após o atentado a bala de ontem, foi incendiado pelos pistoleiros dentro da área indígena Braço Grande. Os incendiários, provavelmente, são os mesmos. (veja nota da BBF no final desta reportagem)
“Ninguém aguenta mais tanta violência, estamos sem nenhuma segurança, o governo do Estado ficou do lado dos poderosos e até a polícia está com eles”, desabafou um indígena. Ele disse que teria vontade de se identificar, mas lembra que se fizer isso estará assinando sentença de morte.
Segundo registro do atentado feito pela polícia do Acará, por volta das 11h30 de ontem (24), os plantonistas receberam a informação de que um veículo “havia sido atingido por disparos de arma de fogo e que uma pessoa teria vindo a óbito”.
O Ver-o-Fato, com base em um vídeo gravado pelo cacique Paratê Tembé, chegou a anunciar, apoiado nesse relato, que duas pessoas teriam sido mortas. Na verdade, apenas uma faleceu em consequência da gravidade dos ferimentos.
No veículo estavam outras três pessoas que foram baleadas e socorridas ao hospital de Acará. Um dos baleados é Adenisio dos Santos Portilho, líder de alguns movimentos de comunidades indígenas contra a empresa BBF. Também foram baleados e encontram-se internados no hospital municipal de Acará: Erismar Souza da Silva e Antônio De Moraes Vieira. Dentre os hospitalizados, um deles estaria em estado grave, baleado na cabeça.
O morto no atentado foi Cleozo dos Santos. Ele já havia sido vítima de uma tentativa de homicídio no mês passado. Seguranças da empresa Stive, que presta serviço para BBF, foram apontados como autores de disparos de arma de fogo que atingiram Cleozo dos Santos, conforme o boletim de ocorrência 00481/2022.101338-2. “O IML foi acionado e irá realizar perícia no local de crime”, resume a polícia do Acará.
Vídeo do ataque a tiros
Tiros de fuzil
O Ver-o-Fato ouviu dois experientes policiais sobre o atentado, após mostrar a eles um vídeo de pouco mais de 20 segundo sobre o momento em que, de dentro de um carro vermelho são desferidos tiros em sequência contra as quatro vítimas que ocupam uma caminhonete de cor branca.
O vídeo divulgado, de acordo com os policiais, é o da segunda vez em que os pistoleiros passam pelo local onde o carro branco com as vítimas estava parado. O baleamento ocorreu na primeira tentativa. Nessa segunda incursão dos pistoleiros, os tiros desferidos tinham a intenção de “amedrontar, afastar curiosos e dissuadir qualquer reação”.
As balas disparadas contra o veículo e que atingiram os quatro ocupantes, ainda segundo os policiais, não seriam de pistolas, mas de fuzil. “As rajadas que se ouve no vídeo são de fuzil, ou de calibre 7.62, ou de 55.6”, afirmam os agentes da lei. Ambos dizem aguardar o resultado da perícia para que suas avaliações sejam confirmadas.
Incêndio destrói casa cultural
Ministério Público Federal (MPF) informou que a instituição vai apurar as circunstâncias de um incêndio que destruiu a casa cultural da comunidade indígena Braço Grande, da etnia Turiwara, em Tomé-Açu, no nordeste do Pará. Segundo denúncia enviada à instituição neste domingo (25), a estrutura amanheceu reduzida a cinzas.
Ontem, os Turiwara foram alvo de um ataque a tiros que também está sendo apurado pelo MPF. Até a manhã deste domingo, dados divulgados pela imprensa e pela comunidade indicavam que pelo menos uma pessoa foi morta e duas ficaram feridas, no limite dos municípios de Tomé-Açu e Acará.
Denunciantes atribuem os crimes a pistoleiros que teriam sido contratados por empresa exploradora de dendê envolvida em disputas de terras na região.
Vídeo cacique Paratê Tembé:
O incêndio à casa cultural
Nota da BBF – Atualização
“A BBF não teve conhecimento expresso e formal do incêndio relatado e se solidariza pelas perdas da comunidade, ressaltando que não tem qualquer envolvimento com essa ocorrência e tampouco possui detalhes deste caso. A BBF destaca que tomou providências jurídicas para averiguar a divulgação de calúnias envolvendo o nome da empresa e espera que as autoridades públicas solucionem rapidamente os casos recentes.”