Eliana Franco Teixeira – Professora Doutora em Direito pela UFPA*
A questão das queimadas na Amazônia tem levantado uma série de questionamentos em relação ao governo brasileiro, seja sobre a suposta indução às queimadas, quando o que se supõe que não era o desejo do governo brasileiro, mas sim fazer com que a floresta tivesse produtividade sustentável, além do intuito na promoção da regularização de terras, enfim, da regularização fundiária.
Ocorre que, o discurso nacional com reflexos internacionais deve ser cuidadosamente pensado para que chegue ao mundo com a sua finalidade bem clara.
Diante deste cenário, surgiu uma grande oportunidade de os Estados-membros da Federação Brasileira exercitarem de forma mais expressiva e abrangente a paradiplomacia (expressão criada, respectivamente, por Ivo Duchacek e Panayotis Sodatos nos anos de 1986 e 1990), colocando os Estados-membros em posição de protagonismo de suas próprias histórias.
O Pará, por exemplo, faz parte do Consórcio firmado pelos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Roraima, Tocantins, conforme o Protocolo de Intenções do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento da Amazônia legal, com o intuito de planejar metas e ações de desenvolvimento sustentável e de segurança para a floresta e para as suas áreas urbanas.
A paradiplomacia se concretiza com a atuação de entes da Federação (Estados-membros e Municípios) nas relações internacionais, por meio de contatos com entidades estrangeiras públicas ou privadas. Quer dizer, os Estados-membros podem utilizar a paradiplomacia para solucionar problemas locais e regionais, por meio de contatos com entidades estrangeiras. Isso comprova o avanço das relações internacionais para além das restritas relações de Estados soberanos.
É evidente que a paradiplomacia não é o único mecanismo de solução de problemas locais e regionais, mas sem dúvida é uma porta, um portal de oportunidades, pelo o que se poderá desenvolver conhecimentos próprios para poder manter a realidade de preservação da Amazônia, mas ao mesmo tempo
desenvolver esta valiosa região que ficou por muito tempo desemparada pela falta de compreensão de seu real valor. Chega de colonialismo, chega de
exploração, já é tempo de desenvolver a região de modo sustentável para o bem do povo desta terra.
A Federação quando adotada em 1891, estabeleceu a participação de governo locais (Estados-membros) de forma tímida em relação às questões legislativas, apesar de ter sido consequência da transformação de um Estado Imperial para um Estado Republicano e Federal, com o intuito de quebrar a centralidade governamental do Império que impedia a administração mínima local na época.
De lá para cá, na atual Constituição vigente, a União sempre tem sido protagonista das competências legislativas e até administrativas, tendo sido elevados os Municípios a entes federativos, em um movimento de municipalização de certo modo perverso, pois tais entes não se encontram em desenvolvimento equivalente se comparados nacionalmente.
A Municipalização ainda carece de desenvolvimento, pois muitos Municípios ainda não se encontram em condições financeiras e de gestão administrativa.
Pela nova Constituição de 1988, os Estados-membros ficaram do ponto de vista legislativo em terceiro plano, pois aquilo que não compete à União e não competir aos Municípios, seria competência dos Estados-membros. Sendo reservados aos Estados as competências de explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado. Os Estado- membros também podem instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões.
Quer dizer, os Estados-membros ficaram de mãos atadas por bastante tempo até a sedimentação da compreensão dos efeitos da Constituição Republicana de 1988.
O contexto atual acordou os gigantes, os Estados-membros que compõem a Amazônia que interessa ao mundo. A pauta de tais Estados deve consolidar a força legislativa e administrativa na Região, buscando fazer da Amazônia um importante ativo, não mais somente como floresta protegida, sem valor agregado de proteção, pois se manter a floresta é importante para o mundo, isso deve ser priorizado como ativo econômico, a preservação tem um preço, precisa-se de recurso financeiro para promover preservação e desenvolvimento sustentável.
É imperioso acelerar o passo da valorização, pois os povos tradicionais precisam viver e querem viver com a Amazônia preservada. Os povos indígenas sabiam e sabem como viver na floresta, sendo que eles também precisam de proteção contra o interesse do desenvolvimento somente exploratório.
Os Estados-membros organizados devem agir em bloco, quer dizer, devem utilizar do consórcio para o desenvolvimento de ações voltadas para região amazônica, evitando a corrida individual e a quebra do pacto do consórcio, pois tais entes foram empoderados em termos políticos e de autonomias administrativa e legislativa, e agindo coletivamente poderão fortalecer a região amazônica.
As Secretarias Estaduais responsáveis pela pauta ambiental e das relações internacionais para tais fins, devem ter um planejamento de curto, médio e longo prazo, para a sábia utilização desta crise ambiental que gera oportunidades. Ganharão os Estados-membros que tiverem compreendido o empoderamento federal conquistado não pela Constituição Republicana de 1988, mas pela necessidade contemporânea de existência de várias frentes de desenvolvimento, de governança coletiva local e regional, de conhecimento e de reconhecimento que a saída para os problemas da falta de recursos, da necessidade de regularização fundiária e do desenvolvimento sustentável, perpassa pelas atitudes dos governos dos Estados-membros. Espera-se que a crise reflita em grandes oportunidades.
A Federação visivelmente toma novo corpo em novo cenário, o contexto da paradiplomacia.
- Eliana Franco Teixeira – Professora Doutora em Direito pela UFPA. Professora do Programa de Mestrado em Gestão Pública do NAEA – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos
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