A Justiça Eleitoral da 45ª Zona de Oeiras do Pará julgou procedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral ajuizada pela coligação “Nasce uma Nova Esperança” (PDT/PSB/PSD) e pelo Partido Social Democrático (PSD) contra a prefeita reeleita Gilma Ribeiro (PP) e seu vice, Ivail Araújo (Republicanos).
A decisão, publicada nesta quarta-feira (19), decretou a cassação dos diplomas da chapa eleita, declarou a inelegibilidade da prefeita por 8 anos e determinou a realização de novas eleições no município.
A sentença, assinada pelo juiz eleitoral Marcello de Almeida Lopes, reconheceu a prática de abuso de poder político e econômico, a partir de contratações em massa de servidores temporários no ano eleitoral, sem respaldo legal e da concessão irregular e desproporcional de horas extras, que aumentaram significativamente os gastos com pessoal.
Segundo os autos, entre fevereiro e julho de 2024, o número de temporários saltou de 719 para 1.438, crescimento considerado incompatível com os afastamentos e necessidades administrativas.
No mesmo período, os valores pagos a esses servidores também dispararam. Só com remuneração de contratados, os gastos passaram de R$ 3,1 milhões (em fevereiro) para mais de R$ 4,1 milhões (em setembro).
No total, os gastos com temporários ultrapassaram em mais de R$ 6 milhões o limite fixado na Lei Orçamentária Anual.
A decisão apontou ainda que vários desses contratados receberam gratificações por horas extras sem qualquer comprovação de efetiva necessidade ou de prestação do serviço.
O magistrado destacou que nem sequer foram apresentadas folhas de ponto ou documentos que justificassem as horas adicionais, inclusive no mês de julho, período sem aulas regulares na rede pública, quando ainda assim foram registrados pagamentos de horas extraordinárias.
“Mesmo diante da ampliação expressiva de contratações, não se demonstrou qualquer situação excepcional que justificasse a sobrecarga de trabalho. Ao contrário, a ausência de documentos comprobatórios revela tentativa de mascarar benefícios eleitorais indevidos”, pontuou o juiz.
A decisão ainda registrou que 38 contratações foram feitas em 5 de julho de 2024, véspera do período vedado por lei, o que caracterizou, na visão do juízo, um artifício eleitoral para ampliar o apelo político da gestão.
Além disso, demissões no período proibido pela legislação também foram identificadas, sem comprovação de legalidade, o que configurou conduta vedada.
Em outra ação, a sentença reconheceu captação por captação ilícita de recursos para fins eleitorais, concluiu que houve uso indevido de recursos públicos, especialmente combustíveis pagos com verbas municipais da secretaria de saúde, para abastecer veículos e embarcações utilizados em atos de campanha eleitoral.
Além disso, foram reconhecidas omissões graves na prestação de contas, como ausência de registro de gastos com bandeiras sublimadas caracterizando caixa dois de campanha.
Segundo a representação, os investigados omitiram na prestação de contas despesas com:
- Serviços de militância, apontados como voluntários, mas sem documentos comprobatórios detalhados;
- Combustível utilizado em carreatas, motociatas e barqueatas, eventos que marcaram a campanha de reeleição da prefeita;
- Confecção e distribuição de bandeiras sublimadas, fartamente registradas em fotos e vídeos anexados ao processo.
A acusação sustentou que tais práticas revelam financiamento da campanha com fontes ocultas, caracterizando caixa dois eleitoral.
Dentre os elementos de prova considerados relevantes, destacam-se:
- Crescimento de 138,92% nas despesas com combustíveis entre os anos de 2023 e 2024, sendo que no período eleitoral de apenas 45 dias (entre 16/08 e 06/10/2024), a Prefeitura gastou R$ 526.705,50 em combustíveis, o equivalente a quase 40% do total consumido nos 227 dias anteriores;
- Depoimento da testemunha que afirmou ter recebido combustível gratuitamente da prefeitura para participar de atos políticos em apoio à prefeita, assim como outros 30 mototaxistas;
- Notas fiscais concentradas em datas próximas a eventos eleitorais, como as de 30/09/2024 (R$ 92.476,00) e 04/10/2024 (R$ 73.374,40), ambas emitidas pelo Posto Conexão Comércio de Combustíveis, contratado pela prefeitura;
- Falta de comprovação de quais veículos foram abastecidos, mesmo após solicitação expressa da Justiça Eleitoral.
A Defesa alegou surto de malária, mas justificativa foi rejeitada, o juiz considerou que os documentos apresentados não comprovam o uso de combustível na proporção declarada.
Destacou, ainda, que a frota oficial do município não está registrada no Portal da Transparência e que não há qualquer vinculação objetiva entre o consumo atípico de gasolina e as medidas emergenciais apontadas pela defesa.
Quanto aos materiais gráficos, o magistrado ressaltou que as bandeiras sublimadas identificadas em imagens e vídeos anexados aos autos não foram declaradas nas contas de campanha. Como os representados não impugnaram diretamente esse ponto na contestação, entendeu-se configurada a omissão dolosa de despesa eleitoral.
O juiz reconheceu a prática de captação ilícita de recursos (caixa dois de campanha), utilização indevida de recursos públicos na campanha.
A decisão ainda cabe recurso ao Tribunal Regional Eleitoral do Pará, mas a Justiça Eleitoral já determinou a ciência ao Ministério Público para apurar crimes e atos de improbidade.
A equipe de reportagem do Portal Ver-o-Fato entrou em contato com a defesa da prefeita, mas até o presente momento não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestações.