As unidades do Ministério Público Federal (MPF) no Pará e no Amapá emitiram recomendação conjunta ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e à Petrobras para que suspendam a atividade de perfuração marítima programada para a bacia da foz do Amazonas.
A atividade vai impactar quatro comunidades indígenas no Amapá e comunidades quilombolas e ribeirinhas no Pará, mas não houve a consulta prévia, livre e informada, que é direito desses povos. Há também enorme potencial de danos ambientais sobre a costa da Amazônia Atlântica que poderiam atingir até o mar territorial da Guiana Francesa.
A recomendação tem por base dois procedimentos do MPF: no Pará, se investiga o licenciamento ambiental dos blocos FZA-M-59 e, no Amapá, a ausência da consulta prévia às comunidades afetadas. O inquérito do Amapá concluiu que povos indígenas e comunidades tradicionais que estão na área de influência do projeto da Petrobras e possuem protocolos de consulta não foram consultados.
Direito desrespeitado
Os povos Karipuna, Palikur-Arukwayene, Galibi Marworno e Galibi Kali’na terão suas terras afetadas pela construção de uma base aérea com previsão de aumento de 3000% no tráfego aéreo e pressão por infraestrutura e serviços. As comunidades quilombolas de Abacatal e Aurá, em Ananindeua (PA), serão afetadas pelo recebimento de resíduos da atividade e a comunidade ribeirinha de Pirocaba, em Abaetetuba (PA), deve sofrer interferência nas atividades pesqueiras. Nenhuma dessas pessoas teve o direito de consulta prévia respeitado.
O inquérito do Pará concluiu que há graves falhas nos estudos apresentados ao Ibama. O licenciamento da atividade começou em 2014 e até agora não foi feito um estudo competente de modelagem mostrando a dispersão do óleo na costa amazônica em caso de acidentes. Para o MPF, há elevada probabilidade do óleo avançar sobre território internacional, sobretudo no mar territorial da Guiana Francesa e sobre a costa de países caribenhos, podendo chegar à fronteira em questão de horas.
Inviabilidade ambiental
Um cenário de acidente representa sérios riscos para a já ameaçada fauna da região, para ambientes de manguezais e para os sistemas recifais amazônicos, que são ecossistemas complexos do qual dependem milhares de pessoas que vivem da pesca. O único estudo apresentado sobre esses riscos foi feito em 2015 por uma consultoria contratada pela BP Energy, a empresa inicialmente interessada na exploração. Depois a Petrobras assumiu a exploração, mas em 2021 apresentou ao Ibama um plano de emergência baseado no mesmo estudo.
O estudo apresenta deficiências e não considera nem a morfologia costeira amazônica nem a hidrodinâmica local. Esses problemas foram apontados por especialistas da Universidade Federal do Pará e reconhecidos em parecer da equipe técnica do Ibama. “As deficiências constatadas na modelagem de dispersão de óleo levam a um efeito em cascata de deficiências no estudo como um todo, ao artificialmente ‘impedir’ que o óleo eventualmente chegue à costa em qualquer simulação efetuada, fazendo com que potenciais efeitos para a costa não sejam considerados no Plano de Emergência Individual (PEI)”, diz a recomendação do MPF.
O MPF aponta ainda a ausência de estudos considerados relevantes pelo Ibama para análises de vulnerabilidade ambiental e de riscos. Com todas essas falhas, não é possível comprovar a viabilidade ambiental nem emitir licença, recomendam as autoridades. A recomendação ao diretor de licenciamento ambiental é de que não emita a licença sem que tenha sido apresentada uma modelagem de dispersão do óleo que incorpore a complexidade da morfologia costeira amazônica e da hidrodinâmica local, assim como a comprovação de capacidade para gestão de riscos socioambientais. Para a Petrobras, o MPF recomendou que não avance para a próxima etapa do projeto de exploração, que é a execução de avaliação pré-operacional, sem ter feito os estudos exigidos.
Tanto Petrobras quanto Ibama devem suspender o avanço do projeto de exploração enquanto não for respeitado o direito de consulta prévia, livre e informada e com boa-fé aos povos indígenas e comunidades tradicionais interessados “devendo ser estritamente observados, inclusive, os respectivos Protocolos de Consulta e Consentimento elaborados pelas próprias comunidades impactadas”, diz a recomendação. A empresa e a autarquia ambiental têm prazo de dez dias para responder aos pedidos do MPF. Fonte: Ascom do MPF no Pará.