Janot: “o bem vida se sobrepõe a eventuais prejuízos econômicos com a paralisação” |
Jatene, ao defender a empresa, diz que mina da Vale gera 850 empregos |
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou-se no Supremo
Tribunal Federal (STF) contra um pedido do Governo do Pará para liberar
o funcionamento da Mineração Onça Puma, empreendimento de extração de
níquel da Vale S.A em Ourilândia do Norte, no sudeste paraense. Já
existem duas decisões judiciais, do Tribunal Regional Federal da 1ª
Região (TRF1) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que ordenam a
paralisação do projeto porque a empresa não cumpriu as obrigações
previstas na licença ambiental.
“Numa justa e adequada ponderação
de valores, o bem vida sobrepõe-se aos eventuais prejuízos econômicos
decorrentes da paralisação do empreendimento, devendo ser prestigiada,
em situações tais, a medida que implicar a mitigação dos riscos de
perecimento do bem maior em disputa, representado, no caso, pela
subsistência física e cultural das comunidades indígenas Xikrin do
Cateté e Kayapó”, diz o parecer de Janot, enviado ao Supremo no dia 27
de novembro.
O governo do Pará argumenta, no pedido de liberação
das atividades da Onça Puma, que o empreendimento gera emprego e
impostos e sua paralisação provocaria prejuízos econômicos à região. De
acordo com o governo paraense, a mina gera 850 empregos diretos e
recolheu em 2014 um pouco mais de R$ 5 milhões em tributos aos cofres
estaduais e municipais.
Nas considerações enviadas à Corte
Suprema, o PGR lembra que a licença de instalação da Mineração Onça Puma
foi emitida em 2004 e até hoje, passados mais de 10 anos, a Vale
continua descumprindo a condicionante que obrigava ações de compensação e
mitigação em favor das comunidades indígenas afetadas. Para Janot, não
se pode agora, reconhecendo o descumprimento da licença, justificar a
manutenção das atividades como se a obrigação fosse nova.
Contaminação
– São sete aldeias dos índios Xikrin e Kayapó afetadas pela Mineração
Onça Puma. Os impactos previstos na licença de 2004 se tornaram
contaminação grave em 2015. O parecer da PGR cita o laudo técnico do
Instituto de Geologia e Engenharias da Universidade Federal do Sul e
Sudeste do Pará (Unifesspa) que comprova que as águas do rio Cateté (do
qual dependem todas as aldeias) “foram gravemente contaminadas pelo
desencapsulamento de metais pesados bioacumuláveis, como ferro, cobre,
níquel e cromo, com sérios riscos para a saúde humana”.
Diz o
parecer: “Note-se que a contaminação do curso de água é fato
incontroverso, porquanto reconhecido pela própria Vale S/A, a qual, no
entanto, atribui a causas naturais a presença de elevada concentração de
metais pesados no rio, conclusão distinta daquela perfilhada pelo
pesquisador da Unifesspa, que apontou a existência de fonte poluidora
potencializada”.
Além do laudo da Unifesspa, há um relatório
assinado pelo médico João Paulo Botelho Vieira Filho, da Escola Paulista
de Medicina, “que indica a recente e inédita ocorrência de inúmeras
enfermidades relacionadas à contaminação por metais pesados entre os
índios da comunidade Xikrin, como angioedemas deformantes, lesões
dermatológicas e cefaleias, antes nunca registradas na comunidade.”
Em
2014, houve um aumento anormal dos casos de malformação fetal entre as
mulheres do povo Xikrin do Cateté, confirmada a ocorrência de seis casos
nos últimos três anos, o que também pode estar relacionado à
contaminação do rio. O governo do Pará chegou a alegar, em seu pedido a
favor da Vale, que os índios afetados dispõem de água encanada e não
precisam usar as águas contaminadas que banham suas aldeias.
Espiral de conflitos
– O procurador-geral da República também informou ao STF que há risco
iminente de o conflito se perdurar com a situação de descumprimento da
licença ambiental por parte da Onça Puma. “A relação de animosidade
entre a empresa Vale S.A e as comunidades indígenas afetadas pelo
empreendimento Onça Puma tem se agravado, seguindo-se uma viciosa e
perigosa espiral de conflitos”, diz.
Em junho de 2014, cerca de
400 índios Xikrin chegaram a bloquear a portaria da mina da Vale,
impedindo a passagem de empregados e ameaçaram atear fogo ao local. Para
Janot, os índios são mantidos em estado de preocupação e agitação,
“seja diante das agressões contínuas ao meio ambiente (com o qual mantêm
uma relação espiritual), seja diante da deterioração das expectativas
de recebimento das compensações financeiras prometidas”
SL nº 933 (confira a íntegra do parecer)
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