Na manhã desta terça-feira (14), mais de 100 indígenas de diversas etnias realizaram uma manifestação em frente à Secretaria de Estado de Educação (Seduc), em Belém, em um ato que simboliza o crescente descontentamento de comunidades escolares com o governo de Helder Barbalho. A pauta central do protesto é a defesa do Sistema de Organização Modular de Ensino (Some), considerado essencial para a educação escolar indígena no Pará, bem como a exigência de maior atenção às políticas públicas destinadas a essas comunidades.
Após a entrada dos indígenas no prédio, surgiu uma ordem superior e a energia elétrica foi cortada, para tentar fazer com que eles fossem embora. “Ninguém vai embora não. Ninguém arreda o pé. Ninguém. Ninguém sai daqui de dentro. Eles vão ter mais trabalho para ficar aqui dentro com essa roupa todinha, passando calor”, disse um professor, olhando para os PMs que estavam no local..
Representantes de povos como Munduruku, Tembé, Xikrim, Borari e Arapium uniram forças para alertar as autoridades sobre os riscos de descontinuidade do modelo educacional modular. Segundo os manifestantes, sem o Some, as especificidades culturais e territoriais dos povos indígenas podem ser gravemente prejudicadas, comprometendo o futuro de centenas de jovens que dependem de uma educação adaptada à sua realidade.
A deputada estadual Lívia Duarte (PSOL), que está no local mediando o diálogo junto aos manifestantes, disse que o movimento, constituído de representantes de várias etnias, inicialmente cobrou a presença do secretário estadual de Educação, Rossieli Soares, mas, como o titular da pasta não atendeu ao chamado, “o movimento radicalizou e só sai da Seduc com a (presença de) Hanna”, segundo a deputada.
Ainda de acordo com ela, os indígenas não têm previsão de sair do prédio e está preparado para permanecer no local por longo período: “Sem previsão de saída, com três dias, uma semana, um mês… só sai com a presença da vice-governadora”.
A pressão sobre o governo estadual se intensifica, especialmente diante do apoio explícito do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação Pública do Pará (Sintepp). Em suas redes sociais, o sindicato reiterou a necessidade de manter o Some e pediu a saída do atual secretário de Educação, Rossieli Soares. “A luta é pela permanência do Some, um modelo que atende às demandas específicas dos povos indígenas. A ausência desse sistema é um retrocesso inadmissível”, destacou a entidade.
Críticos apontam que a situação expõe falhas estruturais na gestão educacional do governo de Helder Barbalho, que já enfrenta desafios em outras áreas da administração pública. O protesto dos indígenas não é um episódio isolado; ele reflete um descontentamento mais amplo com o que muitos consideram uma gestão insensível às necessidades das populações mais vulneráveis, incluindo povos indígenas e comunidades do campo.
Os manifestantes não economizaram nas críticas, afirmando que a possível descontinuidade do Some representa “a morte da educação escolar indígena do Pará”. Além disso, ressaltaram que a luta vai além das demandas indígenas, abrangendo a defesa da educação no campo como um todo.
Esse embate entre as comunidades escolares e o governo Barbalho evidencia a urgência de um diálogo mais inclusivo e transparente, capaz de atender às demandas legítimas dessas populações. Caso contrário, a administração estadual corre o risco de aprofundar um desgaste político que pode repercutir em outros setores.
Desabafo: “queremos ser ouvidos”
Palavras de um dos líderes indígenas: “A gente tá aqui com um objetivo. O nosso objetivo é fazer com que o secretário nos atenda, e a vice-coordenadora também nos atenda, e atenda a nossa demanda. A gente não veio aqui pra brigar com ninguém. Nós não viemos aqui nem pra tocar a gente sequer no computador, em computador nenhum. Nós viemos aqui pra trazer a nossa demanda, nossa reivindicação, e fazer com que eles reconheçam que ao dar uma canetada, contribuindo com a morte da educação escolar indígena do estado do Pará.
Não é de um povo, é dos povos que moram no estado do Pará. É da educação do campo também. Então aqui é uma reivindicação pacífica, porém, Lógico, se não haver o diálogo conosco, não da nossa parte, mas da parte dele, aí nós vamos pro plano B. Mas o nosso objetivo não é isso. Nosso objetivo é a gente sair das aldeias pra vir pra cá, pra essa negociação, e fazer essa negociação passiva.
O certo é que aqui você não vai encontrar um coordenador responsável da equipe. Aqui todos nós seremos responsáveis. Por quê? Porque aqui todos são lideranças. Eu sou cacique, mas eu não mando no povo. Então cada um que está aqui é uma liderança. Então, aqui não tem uma liderança chave. Aqui é todo mundo. E a gente também quer o respeito da parte de vocês com nós. Publicamente eu quero pedir que vocês não usem o abuso do poder, assim como foi usado com os colegas do sindicato lá na Assembleia Nacional do Estado.
Nós viemos com o objetivo de reivindicar o nosso direito. Quebrando o protocolo, primeiro sem agenda, porque quando votaram o projeto de lei na Assembleia, não consultaram os povos indígenas. O rei do norte, o rei da imposição, implementou esse projeto de lei, cabeçou o projeto de lei junto com o secretário de educação, que ele tem raiva dos homens. Ele se declarou inimigo da educação no início que ele assumiu a gestão da Seduc no Pará. E isso é muito claro pra gente.
Então, como extinguiram a nossa oferta, a nossa modalidade de oferta, nós aldeias indígenas, por isso que nós estamos aqui. E se vocês, já que se dispôs a colaborar com a gente, façam contato com a governadora. Ela precisa assinar, no mínimo, um decreto pra gente, regulamentando a oferta da educação pra nós. Isso é muito mais fácil de fazer, muito mais rápido, e a gente fica pouco tempo aqui. Não, não, com certeza. Senhores, como eu falei, qualquer situação conversa com a gente, tá?”
VEJAS IMAGENS