O juiz da Vara Agrária de Castanhal, André Luiz Filo-Creão Garcia da Fonseca, negou embargo de declaração interposto pela empresa Agropalma contra decisão dele, que havia, em agosto do ano passado, determinado o cancelamento das matrículas em cartórios de 12 fazendas, totalizando 23 mil hectares. O pedido de cancelamento foi requerido pelo Ministério Público do Pará.
Esse caso, com decisão do magistrado em sentença lavrada no último dia 29 de janeiro, trata de áreas que foram criminosamente registradas pelo cartório “fantasma” Oliveira Santos, pertencente à cartorária Maria do Socorro Puga de Oliveira, presa pela Polícia Federal em março de 2018 juntamente com o filho dela, Antônio Puga Lobato Filho -, que nunca foi cartorário, mas assinava documentos, dando fé pública às fraudes.
Segundo a Agropalma, a sentença de agosto do ano passado “possui omissão, na medida em que deixou de analisar situação fática relevante, consistente no fato de que a embargante, mesmo antes de ser citada, em 28/08/2018, requereu o cancelamento dos registros imobiliários referentes às Fazendas Castanheira e Roda de Fogo, o que, em seu entendimento, esvaziaria o pedido do Ministério Público neste particular”.
Ocorre que o juiz fulmina a alegação da Agropalma, afirmando que o pedido de cancelamento administrativo, previsto no artigo 214 da Lei de Registros Públicos, “cuida das chamadas nulidades de pleno direito, cujos vícios são aqueles que envolvem apenas e tão somente o registro em si, sendo aferidos exclusivamente pela leitura da matrícula do imóvel, sem que haja a necessidade de análise do título que lhe deu origem, o que não é o caso dos autos, em que as nulidades das matrículas existentes e reconhecidas na sentença decorreram a partir da análise dos títulos que lhes originaram”.
Diz o MP que “a atual Fazenda Roda de Fogo era composta pelas áreas denominadas Três Estrelas, Paraíso do Norte, Roda de Fogo, Esperança, Santa Maria, Jomam, Nova Olinda e São João. Por sua vez, a atual Fazenda Castanheira era composta pelas áreas conhecidas por Castanheira, Castanheira I, Castanheira II e Castanheira IV.”
O fiscal da lei enfatiza ainda que “há vícios na documentação da atual Fazenda Roda de Fogo, uma vez que da análise da mesma, infere-se que há documentos nos quais constam selos do fictício Cartório Oliveira Santos e a assinatura de Antônio Puga Lobato Filho, que jamais fora tabelião, bem como assinaturas de Maria do Socorro Puga de Oliveira em data posterior ao seu afastamento pelo Tribunal de Justiça do Pará”. A situação é a mesma da atual Fazenda Castanheira. Ou seja, o MP afirma existirem “vícios de origem que impedem a aquisição regular do domínio” pela Agropalma.
E mais: o afastamento de Maria do Socorro Puga de Oliveira ocorreu em outubro de 2005, ocasião em que foi nomeado Francisco Valdete Rosa do Carmo como interventor. Além disso, observa que as escrituras públicas de compra e venda foram ”subsidiadas em documentos falsos e lavradas no Cartório Diniz – 2º Ofício de Belém, sendo elas as de números L 573, fl. 38, de 28 de agosto de 2006; L 570, fl. 060, de 25 de abril de 2006 e L 570, fl. 94, de 25 de abril de 2006, por intermédio das quais a demandada Agropalma S/A adquiriu as áreas que compõem as chamadas Fazendas Roda de Fogo e Castanheira”.
Veja a íntegra da decisão judicial que rejeita os embargos da Agropalma:
SENTENÇA (INTEGRATIVA)
Vistos etc.
Trata-se de recursos de embargos de declaração opostos por Agropalma S/A em face da sentença proferida por este juízo no ID 18862016. Sustenta, em síntese, que a sentença hostilizada possui omissão, na medida em que deixou de analisar situação fática relevante, consistente no fato de que a embargante, mesmo antes de ser citada, em 28/08/2018, requereu o cancelamento dos registros imobiliários referentes às Fazendas Castanheira e Roda de Fogo, o que, em seu entendimento, esvaziaria o pedido do Ministério Público neste particular.
Aduz que a sentença foi silente no tocante a essa situação, motivo pelo qual ingressou com os presentes declaratórios. Recebidos os embargos, ordenei a intimação da parte embargada para manifestação. (ID 21201559), tendo a mesma se quedado inerte (ID 22814728).
É o relatório. Decido.
Os embargos não merecem acolhimento.
Isto porque não há qualquer esclarecimento a ser feito na decisão hostilizada. Senão vejamos:
No caso dos autos, a parte autora alega ter solicitado o cancelamento dos Registros Imobiliários referentes às Fazendas Castanheira e Roda de Fogo, o que, em seu entendimento, esvaziaria o pedido formulado pelo Ministério Público neste particular. Não assiste razão ao embargante.
Isto porque, o pedido de cancelamento administrativo, previsto no art. 214 da Lei de Registros Públicos, cuida das chamadas nulidades de pleno direito, cujos vícios são aqueles que envolvem apenas e tão somente o registro em si, sendo aferidos exclusivamente pela leitura da matrícula do imóvel, sem que haja a necessidade de análise do título que lhe deu origem, o que não é o caso dos autos, em que as nulidades das matrículas existentes e reconhecidas na sentença decorreram a partir da análise dos títulos que lhes originaram.
Esta situação é corroborada a partir do que consta do Ofício nº 038/2019 (ID 9417409), de 26 de fevereiro de 2019, da lavra do Sr. Leonardo Fernandes da Hungria, Oficial Interino do Cartório do Acará, onde é referido que o bloqueio das matrículas objeto do presente litígio deu-se em razão da decisão judicial nesse sentido proferida por este juízo nos presentes autos em sede de tutela de urgência (ID 7343343), o que corrobora, pois, a necessidade e utilidade da presente demanda, consignando-se que, em sede de sentença, fora determinado o cancelamento das matrículas em questão.
Desse modo, constato que inexiste qualquer omissão a sanar, de modo que o embargante busca unicamente revolver matéria fática, o que é defeso em sede de embargos de declaração, motivo pelo qual conheço dos declaratórios, porém nego-lhes provimento, mantendo incólume a decisão hostilizada. PRI.
Em, 29 de janeiro de 2021.
André Luiz Filo-Creão G. da Fonseca – Juiz de Direito
Discussion about this post