Helder Barbalho já fez isso quando a ponte do Moju foi derrubada, em 2019, e quando a famigerada SKN vendeu respiradores imprestáveis da China. E agora, por que não age da mesma forma contra Nicolas e outros criminosos?
Em abril de 2019, pouco mais de três meses após assumir o cargo, o governador Helder Barbalho encarou o primeiro grande problema de sua polêmica gestão: uma balsa, a serviço da empresa Biopalma, do grupo da gigante multinacional Vale, derrubou 70 metros da ponte sobre o rio Moju, interrompendo por longos meses o tráfego na Alça Viária e provocando enormes prejuízos à economia e ao povo paraense.
Do alto de sua indignação franciscana, Helder Barbalho veio a público e anunciou, no dia 9 de abril daquele ano, que o Estado havia ingressado com “pedido judicial de ressarcimento dos cofres públicos e bloqueio de R$ 187 milhões” das quatro empresas responsáveis tanto pela balsa envolvida no acidente quanto pelos produtos transportados.
O valor de R$ 187 milhões, segundo o governador, correspondia à reconstrução da ponte, além de outras obras e serviços que seriam realizados para, dizia Helder, “minimizar o impacto que esse episódio traz para as pessoas e a economia do estado”. Ainda no dia 29 daquele mês, a Biopalma resolveu pagar R$ 128 milhões ao Estado, para não ser processada diante das ameaças de justa retaliação do governador e do pedido judicial de ressarcimento ao erário impetrado pelo chefe da Procuradoria Geral do Estado (PGE), Ricardo Sefer.
Um acordo entre as partes foi firmado, com o aval do Ministério Público e homologação do Poder Judiciário. Em menos de uma semana o dinheiro estava na conta do governo. O trecho da ponte foi reconstruído e reinaugurado, mais de nove meses depois, sob fogos, dança e discursos políticos. Em resumo: o governador agiu com firmeza em defesa do patrimônio e dos cofres públicos. Cumpriu sua obrigação constitucional.
Veja o que disse Helder, na ocasião:
Dinheiro dos respiradores
Um ano depois, em maio de 2020, surgiu no cenário o escândalo dos 450 respiradores imprestáveis comprados por um “amigo” de Helder, o empresário André Felipe de Oliveira Silva, da famigerada empresa SKN. Apenas 152 respiradores foram entregues, mas o Estado havia pago antecipadamente R$ 25,2 milhões. Um negócio da China. Helder e André tiveram conversas de aplicativo interceptadas por ordem judicial e nelas ambos tratavam da negociação de maneira nada republicana. O Ver-o-Fato publicou tudo, com exclusividade.
Acuado e sob críticas da população, o governador mais uma vez acionou a PGE, que entrou em ação, ajuizando pedido de devolução do dinheiro pago pela atrapalhada compra. Como forma de pressão, a PGE garantiu na justiça o bloqueio de bens e a suspensão de passaportes dos sócios da SKN. O objetivo era” evitar prejuízos ainda maiores aos cofres públicos e garantir o rápido ressarcimento ao Estado”, alegavam Helder e Sefer. Deu certo.
A ação corria em segredo de justiça, mas em menos de 72 horas André Felipe e os sócios da SKN procuraram o governo de Helder e decidiram firmar um acordo para devolver os R$ 25,2 milhões. No dia 12 de maio, o acordo foi homologado no final da tarde pelo juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública dos Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos da Capital, Raimundo Santana, onde corria a ação civil pública. Em vídeo, Helder Barbalho afirmou que a devolução pela SKN de todo o valor gasto na compra dos equipamentos chineses significa que “não haverá qualquer prejuízo aos cofres públicos”.
Veja a declaração do governador:
E agora? Um ano se passou
Faz quase um ano que a Polícia Federal prendeu doze pessoas, durante a Operação S.O.S, envolvidas no mesmo esquema de fraudes e desvio de recursos da saúde no governo do Pará. No dia 29 de setembro de 2020, a PF foi às ruas e em Belém o principal alvo foi o gabinete do governador do Estado, onde foram realizadas buscas e apreensão de documentos. Contra Helder não havia mandado de prisão. Os recursos desviados dos cofres públicos alcançam valores altíssimos: R$ 1,2 bilhão, segundo a PF.
Entre os presos estavam Nicolas André Tsontakis Morais, operador principal do esquema e responsável pela lavagem de cerca de R$ 455 milhões desviados do combate à Covid-19, no momento em que milhares de paraenses morriam sem atendimento nos hospitais públicos, aparelhados e sob controle daquilo que o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Francisco Falcão, chamou de “organização criminosa”.
Além de Nicolas, foram presos o então secretario de Mineração e ex-chefe da Casa Civil do governo paraense, Parsifal Pontes, o secretário estadual de Transporte, Antônio de Pádua, o assessor de gabinete do governador, Leonardo Maia Nascimento, o ex-secretário adjunto de Gestão Administrativa de Saúde da Sespa, Peter Cassol de Oliveira, bem como os figurões ligados a fraudes nos contratos entre o governo e quatro Organizações Sociais: Instituto Panamericano de Gestão (IPG), Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Birigui, Associação da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Pacaembu e Instituto Nacional de Assistência Integral (Inai). Foram eles Cleudson Garcia Montali, Regis Soares Pauletti, Adriano Fraga Troian, Gilberto Torres Alves Junior, Raphael Valle Coca Moralis, Edson Araújo Rodrigues e Valdecir Lutz.
Pois naquele momento daquelas prisões e da busca e apreensão em seu gabinete de despachos, era para o governador – sentada a poeira da operação da PF, que fez e continua a fazer estragos irreparáveis em sua imagem de homem público – ter feito o que fez no caso da ponte do Moju, em 2019, e do engodo na compra de respiradores chineses, em abril de 2020: chamado seu procurador-geral Ricardo Sefer e determinado que este imediatamente ingressasse com pedido judicial de ressarcimento ao erário público do dinheiro desviado.
Helder não fez isso e perdeu uma boa oportunidade para demonstrar aos paraenses que “foi enganado”, como ele próprio declarou à imprensa nacional sobre seu relacionamento com o empresário André Felipe de Oliveira Silva, da SKN. O cavalo da sorte não passa selado duas vezes seguidas na frente de ninguém.
Mas eis que surgiu uma segunda oportunidade para o governador. E ela veio agora, na semana passada, após a nova operação da PF, que voltou a prender Nicolas Tsontakis Morais e outras 60 pessoas, a grande maioria já solta, inclusive o próprio, Nicolas – hoje curtindo a vida mansa da prisão domiciliar decretada pelo ministro do STF, Dias Toffoli.
Por que, governador, o senhor não recupera o tempo perdido, abraça essa segunda chance e pede logo, judicialmente, por meio da PGE, que os ladrões que firmaram contratos com seu governo, administrando recursos milionários, devolvam os R$ 455 milhões que gastaram comprando fazendas, gado, apartamentos de luxo, aviões, helicóptero, carrões do ano, etc? O que está faltando, governador?
Se não lhe falta coragem, então aja. E rapidamente. Os cofres públicos estão sangrando, governador. Combalidos e arrombados. Os mortos e os infectados pela Covid-19, por sua vez, foram as maiores vítimas desse assalto deslavado ao erário. Essas vítimas não querem, danças, convescotes, ou discursos populistas que só arrancam aplausos de áulicos e bajuladores.
Os paraenses querem ação de sua maior autoridade e a quem deram a confiança do voto, em 2018.
Pense nisso, governador. Caia na real. Antes que seja tarde.