Não tem jeito. O Movimento Popular Unificado de Belém (MPUB) tentou ontem derrubar a decisão do juiz Raimundo Santana, que manteve a proibição de festas de Natal e Ano Novo em Belém decretadas pelo prefeito da cidade, Zenaldo Coutinho, em razão do aumento de casos de Covid-19 na capital.
O decreto diz que estão “proibidos também, a partir das 18h dos dias 24 e 31 de dezembro, até às 11h do dia seguinte, o funcionamento de bares, restaurantes, lanchonetes, barracas, casas noturnas, boates e similares; confraternizações de qualquer natureza em clubes, condomínios, espaços públicos, hotéis, além de shows musicais e pirotécnicos, em ambientes abertos ou fechados, com ou sem cobrança de ingressos; do consumo de alimentos e bebidas em estabelecimentos comerciais autorizados a funcionar ininterruptamente”.
O recurso, chamado agravo de instrumento, contra a decisão do juiz, caiu nas mãos da desembargadora Rosileide Maria da Costa Cunha, do Tribunal de Justiça do Pará e foi indeferido. “No caso, não vislumbro a presença dos requisitos necessários à concessão da tutela recursal”, afirma Rosileide Cunha em decisão obtida com exclusividade pelo Ver-o-Fato.
“Conforme consta no relatório, o agravante defende a presença da probabilidade do direito devido a violação de princípios como o da razoabilidade, proporcionalidade, propriedade privada, defesa do consumidor e livre concorrência. No entanto, é cediço que os mencionados princípios não são absolutos, nem ilimitados, de modo que no caso de colisão com o direito à saúde, por exemplo, devem ser tomadas decisões com mais cautelas”, diz a desembargadora.
Rosileide Cunha ressalta na decisão estar “solidária com a situação em que os vendedores, os pequenos e médios empresários estão enfrentando neste momento de pandemia”. Entretanto, diz ela, “infelizmente, a realidade relacionada ao Covid muda constantemente, de modo que compartilho do posicionamento de que eventuais sacrifícios individuais e renúncias temporárias são imprescindíveis neste momento excepcional, devendo ser entendidos como necessidades passageiras”.
Para a desembargadora, as restrições adotadas pelo prefeito Zenaldo Coutinho não podem ser entendidas como desarrazoadas ou desproporcionais, “uma vez que se trata de horários e datas que são capazes de causar aglomerações que, neste atual cenário de pandemia, são perigosas por envolver questões de saúde relacionados a um vírus de alto contágio e difícil controle, principalmente quando envolve uma quantidade maior de pessoas no mesmo espaço físico, de modo que o requisito do “perigo de dano” milita em favor do agravado”.
Veja, abaixo, a íntegra da decisão de Rosileide Cunha:
” Em suas razões, o agravante assevera que a determinação do fechamento de bares, restaurantes, lanchonetes, barracas, casas noturnas, boates e similares; a realização das festas de Natal e Réveillon, o artigo 3º incisos I, II e III do Decreto no 98.087/2020 de 15/12/2020 que altera o Decreto nº 96.340, de 25 de maio de 2020 viola frontalmente o artigo 170 inciso II, III, IV e V da Constituição Federal, quais sejam, a livre iniciativa, a propriedade privada, a livre concorrência e os direitos do consumidor.
Aponta que os incisos mencionados violam também os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, trazendo grandes prejuízos a empresários que investiram consideravelmente nos dias festivos, que representam o maior faturamento do ano e a comunidade como um todo que será privada de seus direitos básicos e elementares. Assim, requer a concessão do efeito suspensivo ativo ao presente recurso para determinar a imediata suspensão dos efeitos do artigo 3° incisos I, II e III do Decreto no 98.087/2020 de 15/12/2020.
É o relatório.
DECIDO.
Preenchidos os requisitos de admissibilidade, recebo o presente Agravo de Instrumento, nos termos do art. 1.015 do Novo Código de Processo Civil. Estabelece o art. 1.019 do Código de Processo Civil: Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I – poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão.
Pois bem. Sabe-se que a tutela antecipada é o ato do magistrado por meio de decisão que adianta ao postulante, total ou parcialmente, os efeitos do julgamento de mérito, quer em primeira instância, quer em sede de recurso e, para a concessão da medida de urgência faz-se imprescindível a presença de requisitos previstos em lei, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Necessário, ainda, que não haja perigo de irreversibilidade da medida, consoante previsão do art. 300 do Código de Processo Civil.
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra
parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. § 2 o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3 o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. Nesta seara os fatos e o direito trazidos pela peça de ingresso devem demonstrar cabalmente ao magistrado o preenchimento das exigências legais, exigindo o exercício de parcimônia e equilíbrio na análise do feito, sob pena de banalização da medida. O termo “probabilidade de direito” deve ser entendido como a existência de prova suficiente a convencer o juiz de que as afirmações expostas na petição inicial são passíveis de corresponder à realidade.
O “perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”, por outro lado exige a configuração de que se não concedida a medida, seja impossível o retorno ao status quo e que, mesmo sendo viabilizado o retorno ao status quo, a condição econômica do réu não garanta que isso ocorrerá ou os bens lesados não sejam passíveis de quantificação de maneira a viabilizar a restituição integral dos danos causados.
No caso, não vislumbro a presença dos requisitos necessários à concessão da tutela recursal. Conforme consta no relatório, o agravante defende a presença da probabilidade do direito devido a violação de princípios como o da razoabilidade, proporcionalidade, propriedade privada, defesa do consumidor e livre concorrência. No entanto, é cediço que os mencionados princípios não são absolutos, nem ilimitados, de modo que no caso de colisão com o direito à saúde, por exemplo, devem ser tomadas decisões com mais cautelas.
Pois bem. Como é de claro saber da população, o País e as unidades federativas estão passando por uma fase de exceções, no comportamento das pessoas e no funcionamento de empresas, estabelecimentos e instituições, implicando em que todos emprestem a contribuição e a compreensão para as medidas adotadas, no sentido de precaver para evitar a proliferação do vírus.
No caso, trata-se dos efeitos do art. 3° incisos I, II e III do Decreto n° 98.087/2020 de 15/12/2020, que determinou a proibição a partir das 18h dos dias 24 e 31 de dezembro de 2020, até às 11h do dia seguinte: do funcionamento de atividades de bares, restaurantes, lanchonetes, barracas, casas noturnas, boates e similares; da realização das festas de Natal, Réveillon e confraternizações de qualquer natureza em clubes, condomínios, espaços públicos, hotéis, além de shows musicais e pirotécnicos, em ambientes abertos ou fechados, com ou sem cobrança de ingressos; do consumo de alimentos e bebidas em estabelecimentos comerciais autorizados a funcionar ininterruptamente.
Diante da leitura das restrições adotadas, não as entendo como desarrazoadas ou desproporcionais, uma vez que se trata de horários e datas que são capazes de causar aglomerações que, neste atual cenário de pandemia, são perigosas por envolver questões de saúde relacionados a um vírus de alto contágio e difícil controle, principalmente quando envolve uma quantidade maior de pessoas no mesmo espaço físico, de modo que o requisito do “perigo de dano” milita em favor do agravado.
Ressalto que me solidarizo com a situação em que os vendedores, os pequenos e médios empresários estão enfrentando neste momento de pandemia. Entretanto, infelizmente, a realidade relacionada ao COVID muda constantemente, de modo que compartilho do posicionamento de que eventuais sacrifícios individuais e renúncias temporárias são imprescindíveis neste momento excepcional, devendo ser entendidos como necessidades passageiras.
Além disso, é sobremodo importante ressaltar que o presente recurso deve estar acompanhado de prova robusta a justificar a concessão da tutela recursal, bem como deve restar demonstrado a existência de prejuízo irrecuperável, que no caso em tela não ocorreu, até porque o agravante se limita a mencionar que o Decreto fere alguns princípios e “traz grandes prejuízos a empresários que investiram consideravelmente nestes dias que representam o maior faturamento do ano e a comunidade como um todo que será privada de seus direitos básicos e elementares”.
Ressalto que o MM. Juízo de 1o Grau, enquanto presidente do processo, e por estar mais próximo da realidade versada nos autos, detém melhores condições para avaliar a presença, ou não, dos requisitos autorizadores da medida mais adequada.
Pelo exposto, INDEFIRO a tutela recursal requerida no presente agravo de instrumento, visto que não estão presentes os requisitos de tutela de urgência. Nos moldes do art. 1.019 do Novo Código de Processo Civil: a) Comunique-se ao juízo “a quo” sobre esta decisão; b) Intime-se o agravado pessoalmente, para que responda no prazo legal, facultando-lhe juntar a documentação que entender necessária ao julgamento do recurso; c) Após as contrarrazões, encaminhe-se os autos ao Ministério Público, na condição de custos legis.
À Secretaria para as devidas providências.
Belém, 18 de dezembro de 2020.
ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA
Desembargadora Relatora “
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