Na linha de tiro judicial, acusada pelo Ministério Público do Pará de violações de direitos humanos de povos tradicionais e grilagem de terras públicas e privadas, a empresa Agropalma, pertencente a cinco herdeiras bilionárias, filhas do falecido ´banqueiro Aloysio de Faria, acaba de ter mais uma vez sua certificação internacional suspensa. O ato ocorreu no dia 22 de novembro passado.
Essa nova decisão, que pode ensejar o cancelamento definitivo da certificação internacional da empresa e impedi-la de continuar a exportação de dendê e derivados para seus clientes na Europa e Estados Unidos, demonstra´o rigoroso critério da Roundtable do Óleo de Palma Sustentável (RSPO) pela IBD, considerada a maior certificadora da América Latina. Esse critério foi mais uma vez violado pela Agropalma. A RSPO exige que as empresas a ela associadas respeitem os direitos humanos, as comunidades indígenas e quilombolas e não estejam envolvidas em violações das leis nacionais. .
Enquanto isso, o governo do Pará não tem nenhum critério ou seriedade para monitorar e fiscalizar empresas como a Agropalma, apesar de o governador Helder Barbalho, em suas andanças pelo mundo, posando de ambientalista, falar em respeito ao povo amazônico e ao meio ambiente.
Os órgãos subordinados ao governo estadual, como Iterpa e Semas, são manipulados no jogo político e cumprem ordens, inclusive ignorando decisões judiciais e engavetando processos administrativos. Ou permitindo, como no caso da Semas, que a Agropalma atue há mais de dois anos no Estado sem licenciamento ambiental, negado pela própria Semas, que apesar disso virou as costas à fiscalização da empresa.
ENTENDA O CASO
Em fevereiro deste ano, a Agropalma teve a certificação internacional de plantações de dendê suspensa por violações de critérios da RSPO. A informação foi divulgada à época pelo Ver-o-Fato, mais uma vez. Em nota, na ocasião, a empresa disse que recebeu um comunicado informando da suspensão temporária. A companhia informou ainda que “analisou o relatório da certificadora e discorda dos apontamentos por entender que a avaliação foi inadequada, pois não reflete a realidade e as regras da RSPO e, por este motivo, recorreu da suspensão”.
“Ressaltamos que os certificados RSPO das refinarias da Agropalma, em Belém (PA) e Limeira (SP), seguem vigentes e não haverá impacto na entrega de pedidos”. A primeira certificação da Agropalma, segundo a empresa, ocorreu em 2011, mesmo ano em que o empreendimento foi condenado pela Justiça do Pará a pagar R$ 960 mil por condições degradantes de trabalho.
A atuação da empresa no Pará com as plantações de palma, de onde se extrai o óleo de dendê, comercializado internacionalmente, é marcada por embates com comunidades tradicionais, que envolvem acusações de grilagem e até cartório-fantasma. O conflito passou a ser conhecido como “guerra do dendê”. “Sempre demonstramos total comprometimento e evidências sólidas quanto ao atendimento dos Princípios e Critérios da RSPO” e “atuamos sob regras rígidas e somos reconhecidos mundialmente por nossas práticas sustentáveis e transparência em nossos processos”, afirma a empresa.
No entanto, desde 2016, a Polícia Federal no estado do Pará investiga a Agropalma pela suposta existência de um esquema criminoso. Documentos falsos teriam sido produzidos e usados por funcionários da empresa para a regularização das terras junto a órgãos públicos, e possível acesso a recursos oriundos de financiamento público em detrimento dos moradores que ali vivem.
Em março de 2018, foram cumpridos mandados de prisão temporária de quatro pessoas diretamente envolvidas no esquema, inclusive um funcionário da Agropalma, e de busca e apreensão de materiais da empresa. Segundo afirmou a PF após a operação, “Indícios apontam para que sejam casos de grilagem (…). A Agropalma é a real beneficiária de todo o esquema criminoso”. Afirma ainda que “(…). Eles vinham até um cartório em Belém, faziam uma escritura falsa, toda uma cadeia dominial falsa, terminando sempre na empresa, como se a terra depois de todas essas vindas fosse por último vendida para a empresa. Depois voltavam ao município em questão e restauravam livros que supostamente estariam extraviados.”
E mais: segundo a investigação, uma portaria do Tribunal de Justiça do Pará autoriza que um livro de escrituras extraviado possa ser restaurado caso o interessado tenha um indício documental. Usando desse artifício, a Agropalma estaria fazendo esse restauro com base em documentos falsos, colocando as terras em nome da empresa e aumentando o tamanho delas. Em seguida, dava seguimento ao processo de regularização fundiária em órgãos públicos.
Em agosto de 2018, o Ministério Público do Estado do Pará ajuizou uma Ação Civil Pública na qual requer, entre outras providências, a nulidade e o cancelamento de registros imobiliários referentes a duas fazendas, Roda de Fogo e Castanheira, as quais somariam mais de 9.501 hectares equivalendo ao tamanho de quase 9 mil campos de futebol. Ambas teriam sido adquiridas pela Agropalma por meio de registros falsos, realizados num cartório fictício da cidade, e em tramitação no Instituto de Terras do Pará (Iterpa).
A Justiça da Vara Agrária de Castanhal acolheu os pedidos do MP e mandou cancelar os títulos e as escrituras em cartórios do Acará e de Belém. A Agropalma recorreu e a Turma de Direito Público do TJ do Pará, pelo voto de duas desembargadoras, deu uma guinada no caso, anulando a decisão do juiz de Castanhal. O caso está sob recurso do MP e deve ser julgado antes do recesso do judiciário, no próximo dia 19.
Além disso, hoje, na Justiça Federal de Belém tramita uma ação penal em que a Agropalma, figura como ré, denunciada pelo Ministério Público Federal (MPF) por corrupção ativa e passiva e fraudes em documentos públicos.
VEJA O DOCUMENTO DA SUSPENSÃO

