A Unimed Belém, uma das principais cooperativas de serviços médicos da região Norte, enfrenta uma crise sem precedentes, resultado de uma gestão desastrosa que já dura vários anos, mas se aprofundou de 2021 para os dias de hoje. A cooperativa corre sério risco de intervenção por parte da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), com a possibilidade de bloqueio dos bens dos membros do conselho de administração e diretoria executiva, além da perda do direito de usar a marca Unimed, uma das mais respeitadas no setor de saúde suplementar. Ela tem 30 dias para resolver seus problemas. Será que há tempo para isso?
O caos financeiro e administrativo se tornou evidente, e a situação exige medidas urgentes.
A Unimed do Brasil, em ofício, alertou sobre a iminência de uma direção fiscal e técnica por parte da ANS, cumprindo o que determina o artigo 12, III da Constituição do Sistema Cooperativo Unimed e o artigo 2º da Norma Derivada nº 011/10. A situação é grave e pode culminar no cancelamento da autorização de funcionamento da Unimed Belém como operadora de planos de saúde, caso não sejam revertidas as anormalidades econômico-financeiras e administrativas que assolam a cooperativa.
A entidade médica já passou por três direções fiscais, sendo a última entre dezembro de 2016 e agosto de 2017. Agora, a cooperativa está prestes a sofrer uma nova intervenção, fruto de uma série de falhas graves em sua gestão financeira. Nos anos de 2021 e 2022, quando o setor de saúde suplementar apresentou resultados positivos em meio à pandemia, a Unimed Belém seguiu na contramão, enfrentando um processo de deterioração financeira marcado por empréstimos bancários insustentáveis e uma gestão incapaz de reverter a situação.
Em novembro de 2021, a cooperativa alcançou uma alarmante pontuação de apenas 3 pontos, dos 100 possíveis, na avaliação econômico-financeira da Unimed do Brasil. No ano seguinte, a situação piorou ainda mais, com a cooperativa atingindo meros 2 pontos em junho de 2022. Em 2023 e 2024, a situação chegou ao extremo, com a Unimed Belém recebendo notas zero em alguns meses, um claro reflexo da gestão caótica que põe em risco o futuro da operadora.
O alerta vermelho já foi acionado na Diretoria de Normas e Habilitação de Operadoras (DIOPE) da ANS, que aguarda um plano de adequação econômico-financeiro que, até o momento, não foi apresentado. Além disso, a Unimed Belém ainda enfrenta os desafios de estar associada à Unimed Fama, que também passa por direção fiscal e enfrenta uma crise financeira gigantesca. A situação é tão grave que a Unimed Fama deve mais de R$ 6,5 milhões ao sistema Unimed Nacional, sem contar os juros moratórios.
Anormalidades administrativas e risco de colapso total
No campo administrativo, a situação da Unimed Belém é igualmente preocupante. O atual presidente do Conselho de Administração, Wilson Niwa, está no cargo há 11 anos, desde 2013, mas sua atuação fere diretamente as normas da ANS. Niwa também era presidente da Unimed Fama, que está sob direção fiscal, o que o impede legalmente de atuar como administrador da Unimed Belém, conforme estabelece o artigo 3º, IV da RN nº 520/22 da ANS.
Essa irregularidade pode levar ao cancelamento da autorização de funcionamento da Unimed Belém, com a transferência compulsória da carteira de beneficiários e o consequente cancelamento do registro da operadora. O prazo para que a cooperativa substitua o administrador está se esgotando, e a inação dos dirigentes pode resultar em consequências drásticas para a empresa e seus associados.
Além disso, a Unimed Belém figura entre as 10 operadoras de grande porte com o maior número de reclamações registradas na ANS e está na faixa mais crítica no monitoramento de garantia de atendimento. Esse cenário reforça a ideia de que a cooperativa não só enfrenta problemas internos graves, mas também falha em prestar um serviço de qualidade a seus beneficiários, o que pode comprometer definitivamente sua imagem e a confiança dos clientes.
Um futuro incerto
A Unimed do Brasil deu um prazo de 30 dias para que a Unimed Belém tome as medidas necessárias para corrigir as anormalidades detectadas. Caso contrário, a cooperativa poderá sofrer intervenções severas, que incluem desde o bloqueio de bens até a perda da marca Unimed, o que seria um duro golpe para o sistema cooperativo como um todo.
A comunidade de beneficiários, médicos cooperados e colaboradores da Unimed Belém aguarda com apreensão os próximos passos. A recuperação dessa cooperativa histórica depende de ações imediatas e eficazes, e o tempo para salvar a Unimed Belém está se esgotando. O que está em jogo não é apenas o futuro de uma operadora de saúde, mas a confiança em um sistema que sempre se destacou pela solidariedade e qualidade no atendimento.
Chuva de reclamações de usuários
Em Belém, os beneficiários da Unimed Belém já sentem os impactos dos problemas administrativos e financeiros que a cooperativa enfrenta. Márcia Cristina Brito, de 56 anos, em entrevista ao jornal O Liberal, relata a dificuldade para conseguir uma consulta com um neuropediatra para sua neta de seis anos. “Estou há quase três meses esperando eles me ligarem para marcar a consulta e até agora nada”, desabafa. Além disso, ela menciona o descredenciamento de laboratórios, o que torna a realização de exames uma verdadeira batalha: “Agora, pra conseguir um exame é um sacrifício”.
Outro usuário insatisfeito é o engenheiro agrônomo Afonso Queiroz, que enfrenta obstáculos com a burocracia para conseguir liberação das guias de terapias ocupacionais e fonoaudiológicas para o filho. “A gente tem dificuldade, devido à condição do nosso filho, para liberação das guias. É relutante aqui”, reclama Afonso, que também critica os valores pagos pelo plano, considerando que o serviço prestado está aquém do esperado.
Diego Arruda, servidor público de 35 anos, aguarda por uma cirurgia desde o começo de agosto. Apesar de o procedimento estar marcado para esta sexta-feira (20/9), ele foi desmarcado de última hora por questões burocráticas. “Disseram que até hoje (quinta-feira) estaria resolvido, mas até agora nada”, lamenta Diego, que também enfrenta dificuldades para agendar consultas: “Muitos médicos, se for particular, têm disponibilidade, mas pelo plano de saúde, só daqui três meses”.
A crise não se restringe apenas aos usuários. O Sindicato dos Médicos do Pará (Sindmepa) também manifestou preocupação com o descredenciamento de médicos e a possível descontinuidade dos atendimentos. Em nota, o Sindmepa afirma que “expressa sua preocupação com a situação da Unimed Belém, que vem perdendo sua carta de médicos cooperados”, e que seguirá acompanhando o caso para garantir a qualidade dos serviços.
O Ver-o-Fato tentou contato com a Unimed Belém, mas não obteve resposta até o momento. O espaço permanece aberto para manifestação.