Em uma decisão de 12 páginas, o desembargador Mairton Carneiro, agora na condição de relator do caso – ontem, ele havia se negado a julgar o recurso, alegando que estava no plantão do Judiciário e que o agravo de instrumento deveria ter sido apresentado no horário do expediente normal do TJ -, cassou a decisão do juiz Raimundo Santana às 11h30 desta manhã, 24, mandando a primeira dama e agora conselheira do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Daniela Barbalho, mulher do governador Helder Barbalho, de volta ao cargo para o qual fora nomeada.
“Nessa esteira de raciocínio, não há dúvida acerca da necessidade de suspensão da decisão agravada, pois a probabilidade do direito resta demonstrado, já que a decisão se encontra viciada em razão de ter sido proferida além do que foi requerido em sede de liminar (ultra petita), bem como em razão de liminarmente ter exaurido o mérito da ação de origem”.
“De igual modo, nota-se que a decisão agravada irá causar grave prejuízo ao Estado do Pará (periculum in mora), pois irá atrasar o andamento dos processos que estão sob a responsabilidade da Conselheira Daniela Lima Barbalho, ora agravada, os quais correrão o risco de serem anulados, além disso, a mesma já participou de diversos julgamentos perante o TCE-PA, compondo o quórum de julgamento de 531, processos que poderão ser anulados, caso seja mantida a decisão recorrida”
“Ou seja, trará consequências jurídicas irreparáveis às partes interessadas, bem como o risco de dano grave ao Estado, eis que o agravante está sendo compelido a cumprir a determinação judicial que poderá causar graves prejuízos no andamento dos feitos que estão sob a relatoria da agravada no âmbito do TCE-PA, pois todos os seus atos poderão ser anulados, causando consequências jurídicas irreversíveis sob o ponto de vista processual. Isto posto, DEFIRO o pedido de efeito suspensivo deduzido, devendo ser suspensos os efeitos da decisão recorrida até pronunciamento definitivo deste Tribunal. Intime-se os agravados”. afirma o desembargador na decisão.
Portanto, está derrubada, em tempo recorde menor do que 24 horas, a sentença do juiz Raimundo Santana, que acolheu ação popular, afirmando que havia “nepotismo cruzado e ofensa à moralidade administrativa” na nomeação de Daniela para o cargo.
“Foi além do pedido”, diz Mairton
Ao criticar a decisão de Santana, o desembargador argumenta que o juiz “foi além do pleiteado pelo requerente, ora agravado (ex-deputado Arnaldo Jordy, do partido Cidadania), pois ao invés de suspender os efeitos da nomeação e posse da Sra. Daniela Lima Barbalho para o cargo de Conselheira do Tribunal de Contas do Estado do Pará, em verdade tornou sem efeito o Decreto Legislativo nº 04/2023 e o decreto de nomeação de Daniela Lima Barbalho para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Pará. Nessa linha, ao tornar sem efeito a nomeação e a posse, ao invés de tão somente suspender seus efeitos, tem-se que a decisão fora ultra petita, ou seja, o magistrado a quo foi além do pedido do autor, dando mais do que fora pedido nos autos”.
Ainda segundo Mairton, “nota-se que ao confrontar os pedidos da exordial e a decisão agravada, de fato houve extrapolação do pedido proferindo o juízo decisão ultra petita, que, conforme ensina Humberto Theodoro Junior, ocorre quando “o juiz decide o pedido, mas vai além dele, dando ao autor mais do que fora pleiteado”. Neste sentido, seguramente se pode dizer que o requerimento da parte interessada é conditio sine qua non ao Estado-juiz para que seja concedida a tutela de urgência, sob pena de restarem ultrapassados os limites objetivos e subjetivos impostos na petição inicial. Outrossim, insta salientar que é nítida a inobservância do princípio da congruência, pois, a decisão agravada exauriu o mérito da Ação Popular, uma vez que concedeu em sede de tutela antecipada o pedido final da ação, tornando sem efeito os decretos e sustando os efeitos dos atos praticados pela Conselheira no âmbito do TCE, quando, como demonstrado, o pedido liminar foi apenas no sentido de suspender a nomeação e posse da mesma”.
Sempre pautado na mesma linha de raciocínio, o desembargador do TJ do Pará afirma também que em sua decisão o juiz Raimundo Santana ” analisou ainda questões meritórias, em um pré-julgamento, onde afirma que: “do ponto de vista formal, portanto, há indicativo de que foram observados os elementos ritualísticos”. E ressalta: “a questão de fundo repousa no aspecto relativo à substância dos atos que levaram à nomeação da ré.”
Como se sabe, diz Mairton Carneiro, “no primeiro momento de análise de pedido liminar, o Magistrado deve se ater aos requisitos necessários para a concessão da liminar pleiteada, sem adentrar o mérito do pedido final da ação, o qual deve ser precedido do contraditório e ampla defesa. A decisão liminar possui um caráter de excepcionalidade, em razão da urgência em antecipar um direito, que apresenta perigo de ser perdido, porém essa decisão excepcional deve ser revestida de reversibilidade. A reversibilidade é condição indispensável à tutela de urgência, portanto, ao conceder uma tutela antecipada é necessário preservar o direito do réu à reversão do provimento”.
E mais: “a decisão, ora analisada, ao tornar sem efeito o decreto de nomeação da Conselheira, bem como sustar os efeitos dos atos por ela praticados, acaba por decidir de forma definitiva, ultrapassando o pedido liminar feito pelo autor, que requereu no primeiro momento apenas a suspensão do decreto legislativo e do decreto de nomeação, sem observar o critério da
reversibilidade. Repise-se, a reversibilidade traduz-se na ideia de que deve haver a possibilidade de retorno das coisas ao estado anterior, motivo pelo qual o pedido do autor, em sede de tutela antecipatória, foi no sentido de suspender, e somente no mérito requereu a anulação dos decretos. Contudo, a decisão antecipatória ao tornar sem efeito os decretos, na realidade anulou os mesmos, posto que “tornar sem efeito” é sinônimo de “anular”, “cancelar”, “suprimir”, “invalidar”, “cassar”, “abolir”.