Um filme que brilha ao seguir pela via da despretensão
Concebido como o trabalho de conclusão de um workshop de cinema e sem usar atores profissionais, Plano-Sequência dos Mortos (2017) foi gravado em oito dias, com um minúsculo orçamento e já lucrou mil vezes mais que o seu valor.
O filme se divide em três atos de aproximadamente 30 minutos: No primeiro, uma equipe realiza um filme de zumbis em um reservatório de água abandonado, onde no passado, o exercito japonês realizou experimentos, logo o que era ficção, se torna real e a equipe precisa sobreviver ao apocalipse zumbi; no ato seguinte, 37 minutos de carnificina depois, a história volta um mês antes e descobrimos que tudo não passa de um filme promocional para o lançamento de um canal sobre zumbis, onde vemos a produção do filme, e por fim, o making of, constituindo o terceiro e último ato.
Os Mortos
A tradição dos filmes de zumbi, criada por George Romero, preza pelo uso dos zumbis como alegoria sócio-política. Porém, esta abordagem encontra-se desgastada pelas duas décadas nas quais mortos-vivos dominaram os holofotes da cultura pop.
Em Plano-Sequência dos Mortos , o diretor Shin’ichirô Ueda da um fôlego a mais aos seus personagens quando decide caminhar entre a liberdade caricatural da farsa e o humor involuntário causado pela falta de recursos, característica recorrente em produções de baixo orçamento.
O Plano-Sequência
Os 37 minutos iniciais de Plano-Sequência dos Mortos se sustentam sobre uma das mais importantes peças da arte cinematográfica, o plano-sequência. Ele se apresenta como uma cena que transcorre sem cortes, onde sua função principal é oferecer um tom realístico ao espectador que assiste a uma ação ininterrupta.
Filmes como 1917, de Sam Mendes, arrastam o público por uma série de planos-sequência que estão sutilmente mesclados em duas horas de duração, tentando assim, levar a experiência do filme ao limite. Ueda usa a urgência do recurso primeiramente como um motor para os momentos cômicos da primeira parte, já que a filmagem precisa seguir mesmo com os acidentes que a câmera registra, e depois, ao mostrar o making of do plano-sequencia ele exibe toda a coreografia e trabalho necessário do diretor e da equipe para que tudo funcione. De quebra, as piadas vistas da primeira vez ganham um novo significado na revelação de seu real motivo nos bastidores.
Filmes recentes como Artista do Desastre (2017) e Meu Nome é Dolemite (2019) já vinham celebrando as desventuras de diretores obstinados que, ao longo dos anos, encontraram o reconhecimento do público por vias tortas. A loucura e alegria de fazer filmes com pouco dinheiro exige um tipo de união, que torna a equipe realizadora uma família, disposta a enfrentar as adversidades e é esse engajamento que quase sempre torna ainda mais especial os filmes de terror, gênero onde uma parcela do púbico se delicia e abraça as dificuldades técnicas. Plano-Sequência dos Mortos encontra uma suave ternura nessa unidade entre o público e os realizadores, como uma grande família que ama o cinema.
O filme pode ser encontrado com legendas em português no MUBI.
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