O ministro Ricardo Villas Boas Cuevas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou provimento ao recurso da empresa Agropalma contra decisão do Tribunal de Justiça do Pará, que não acolheu recurso especial em que a empresa voltou a defender a ilegitimidade da Vara Agrária de Castanhal no processo que apura fraudes e grilagem de terras privadas e públicas. praticadas pela empresa.
O voto do relator foi acompanhado por unanimidade pelos ministros da Terceira Turma do STJ, que mantiveram a multa aplicada pela justiça do Pará contra a Agropalma, no valor de 2% do total da causa, a favor da família Tabaranã, proprietária de áreas hoje em poder da empresa. Para o ministro, o recurso da Agropalma é meramente protelatório. A decisão é de 11 de maio último.
Trata-se de agravo interno no recurso especial em ação reivindicatória e conflito de competência. Os ministros da Terceira Turma, também por unanimidade, haviam negado provimento ao recurso anterior, em 3 de outubro de 2019. A Agropalma alega que o fórum competente para julgar a ação é a Vara do Acará e não a Vara Agrária de Castanhal.
“Não há que falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. Não escapa o recorrente da imposição da multa de que trata o § 2º do art. 1.026 do Código de Processo Civil de 2015, ante a oposição de declaratórios de caráter manifestamente protelatório. Agravo interno não provido”, decidiu o ministro.
Em 13 de fevereiro de 2019, a desembargadora Luzia Nadja Guimarães Nascimento, em decisão aprovada pelo Pleno do Tribunal de Justiça do Pará, reforçou o interesse público no caso, que já havia sido reconhecido pela presidência do Tribunal, em decisão proferida em 17 de abril de 2017, declarando válidos os atos processuais praticados por ela.
Luzia Nadja, vale lembrar, em sentença de agosto de 2011 – por sinal já transitada em julgado, portanto, coisa decidida e sem direito a novos recursos -, tornou nulos os registros imobiliários e cancelou todas as matrículas oriundas da grilagem de Jairo Mendes Sales. Foi de um irmão de Jairo, de prenome Siloni, que a Agropalma comprou as terras. E desde então tenta legalizá-las, no total de 106 mil hectares, usando os mesmos documentos falsos já fulminados pela sentença irrecorrível de Luzia Nadja.
“Não há como ignorar nos autos razões e documentos denunciando o interesse público no litígio em tela. As alegações apontadas ao norte, comprovadas por documentos; a iniciativa da Procuradoria-Geral do Estado em requerer, junto ao cartório do único ofício de Acará, o cancelamento de matrículas imobiliárias que estão em nome de pessoas envolvidas no litígio; o ingresso do Iterpa na ação reivindicatória anunciando que parte das terras discutidas no litígio foi arrecadada pelo Estado; a notícia da existência de ação penal e inquéritos policiais para apuração de fraude documental e pericial; e, por fim, a instauração de inquérito civil público, pela Promotoria Púbica de Direito Agrário de Castanhal, para examinar registros de imóveis envolvidos no litígio, são razões plausíveis para o reconhecimento do interesse público nesse caso”, alegou a desembargadora.
“Além disso, a embargante tenta por via e momento processual equivocados discutir o mérito da própria ação reivindicatória deixando claro, ao meu sentir, o intuito de procrastinar o andamento do processo cuja tramitação se arrasta desde 31/01/2014, sendo que desde a publicação do Acórdão nº 196.237 (27/09/2018), ora embargado, o qual dirimiu o conflito negativo de competência, até a presenta data sequer foi remetido ao órgão colegiado declarado competente, devendo acrescentar que a embargante está na posse das áreas em litígio, razões pelas deve incidir na espécie a multa do §2º do art. 1.026 do CPC em seu patamar máximo dada a capacidade econômica da embargante. Ante o exposto, conheço e nego provimento aos embargos de declaração, dada ausência dos vícios apontados, aplicando a embargante multa de 2% (dois por cento) sobre o valor atualizado da causa, em razão do manifesto propósito protelatório”, completou a desembargadora.
O Ver-o-Fato abre espaço para que a Agropalma se manifeste sobre a decisão do STJ. Veja, abaixo, o voto do ministro e a decisão do STJ :
AQUI O VOTO DO MINISTRO DO STJ RICARDO VILLAS BOAS
AQUI O ACÓRDÃO COM A DECISÃO UNÂNIME DOS MINISTROS DO STJ
Entenda o caso
A justiça do Pará determinou o bloqueio das matrículas referentes a várias fazendas adquiridas pela empresa Agropalma, no município de Acará, nordeste do estado. De acordo com a denúncia, a empresa utilizou registros falsos no momento das matrículas.
O inquérito encaminhado à justiça foi originado de uma série de investigações feitas pelo Ministério Público do Estado, segundo as quais, as áreas das fazendas foram alienadas com base em documentos falsos emitidos por cartório inexistente.
Ainda conforme as investigações, os documentos falsos foram assinados por Maria do Socorro Puga de Oliveira, a tabeliã do município, mas em data posterior ao seu afastamento do cargo. Tudo com o carimbo do cartório “fantasma” Oliveira Santos. A cartorária e o filho dela, Antonio Pinto Lobato Filho, que embora nunca tenha sido tabelião, colocou, juntamente com a mãe, a assinatura dele nos documentos fraudulentos, foram presos pela Polícia Federal em março de 2018, durante operação em que também foi preso, por envolvimento na maracutaia, o então gerente da Agropalma, Antônio Pereira da Silva. O inquérito ainda não foi concluído pela PF.
No inquérito, o MPPA requereu a nulidade e o cancelamento de registros imobiliários referentes às fazendas. Além disso, requereu o pagamento de uma indenização por parte da Agropalma em decorrência aos danos morais e coletivos causado à sociedade, em decorrência da grilagem das terras.
Mais recentemente, no dia 23 de abril passado, a promotora de justiça Eliane Moreira, da Vara Agrária de Castanhal, ajuizou ação civil pública para anular e cancelar os registros de imóveis que compõem a Fazenda Porto Alto – de 35 mil hectares – que a Agropalma diz ser dela. A promotora move o processo devido a uma série de fraudes e irregularidades praticadas pela empresa, com participação do Instituto de Terras do Pará (Iterpa) e da empresa IBD Certificações Ltda, também réus na ação.
A promotora quer ainda que a Agropalma seja condenada “a pagar indenização por dano moral coletivo causado à sociedade paraense em decorrência das fraudes perpetradas relativas aos registros públicos, tendo em vista os graves prejuízos econômicos, sociais e ambientais que tal prática ocasiona”. A ação, ajuizada na quinta-feira (23), decorre de investigação extrajudicial referente a ilegalidades na expedição de títulos definitivos e a fraudes em registros públicos.
O inquérito civil 000628-040/2016, que precedeu a ação penal, foi instaurado para analisar os documentos imobiliários de áreas supostamente da empresa Agropalma, após denúncias de fraudes concretizadas através de esquema de grilagem de terras, apontando-se irregularidades nas cadeias dominiais.
A promotora lembrou que parte do histórico de irregularidades alegadas na ação pode ser obtida na decisão monocrática de 30 de agosto de 2011 da então desembargadora Luzia Nadja Guimarães, na ação cível 2003.3.0013575, que ressalta que as fraudes que macularam os registros constantes na origem dos títulos definitivos e das matrículas impugnadas, já foram reconhecidas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará em demanda judicial de iniciativa do próprio Estado do Pará.
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