O governador do Pará, Helder Barbalho, deveria ter comparecido na sessão de hoje, 30, da CPI da Covid, em Brasília. A convocação tinha o objetivo de questioná-lo sobre os recursos que ele recebeu do governo federal para aplicar no combate à pandemia da Covid-19. No dia 21 passado, porém, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, suspendeu a convocação de Helder e de outros 18 governadores, alegando que a CPI “excedeu os limites constitucionais”.
A decisão da ministra representou, mais uma vez, a interferência do Judiciário sobre a independência e as prerrogativas do Legislativo, o que definitivamente desmoralizou a CPI. Para Helder, contudo, a decisão de Rosa Weber livrou-o de uma imensa enrascada, tudo aquilo que gostaria de evitar. Ele seria bombardeado de perguntas incômodas e incisivas pelos senadores, sob os holofotes, ao vivo, das redes de TV, rádios, jornais, portais de notícias e blogs.
O governador não iria suportar a pressão e estaria exposto diante de todo o país. Principalmente daqueles que desconhecem detalhes sobre as coisas que ocorrem no Pará durante a gestão do emedebista. Em vista disso, a decisão da ministra caiu do céu para o governador. Facultar a ele a iniciativa de ir depor teve o mesmo efeito de dizer que Helder estava livre para não ir. E ele, lógico, não foi. Melhor dizendo, fugiu.
Os senadores iriam cobrar do governador explicações, dentre outros assuntos, sobre a desastrada operação, conduzida diretamente por Helder, na aquisição de 400 respiradores da China por R$ 50 milhões, dos quais R$ 25,2 milhões foram pagos adiantadamente pelo próprio governador em tratativas eivadas de irregularidades, segundo investigação da Polícia Federal, que prendeu 8 pessoas, incluindo servidores públicos e empresários.
A divulgação com exclusividade, pelo Ver-o-Fato, nos dias 23 e 24 passado, de conversas sigilosas quebradas por ordem judicial entre Helder e o empresário André Felipe de Oliveira – divulgação essa que, aliás, minutos depois, provocou a invasão do portal por hackers, tirando-o do ar por dois dias seguidos -, trouxe à tona questões que apontam para supostas ilegalidades sobre a forma como ocorreu a negociação.
Segundo o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Francisco Falcão, relator do caso e de quem partiu a decisão de decretar o bloqueio de bens de Helder Barbalho no valor de R$ 25,2 milhões, além de outros envolvidos no esquema, a escolha direta da empresa de André Filipe, responsável pela compra dos respiradores chineses se deu “possivelmente em razão da relação próxima e amistosa” entre o governador e o empresário. Essa relação de amizade seria objeto de perguntas na CPI.
Outra pergunta que certamente seria feita por integrantes da CPI diz respeito à manifestação de Francisco Falcão de que “diversos elementos de prova coligidos indicam o direcionamento da contratação por parte do governador e a posterior montagem de certame licitatório com a finalidade de regularizar a aquisição que já havia sido realizada e, inclusive, paga”. O ministro do STJ afirmou isso no mandado que autorizou busca e apreensão nos locais onde residem e trabalham os envolvidos no caso.
Falcão enfatizou ainda que as conversas travadas entre Helder e André “demonstram claramente o conluio entre a mais alta autoridade do Estado e a empresa contratada, que recebeu o pagamento milionário de forma antecipada”. Além disso, o ministro ressalta que a SKN, empresa de André Felipe, foi favorecida em outra contratação, no valor de R$ 4,2 milhões. Esse outro negócio com os chineses tratou da compra de bombas de infusão e também aparece nos diálogos publicados pelo Ver-o-Fato.
Realmente, não comparecer à CPI parece outra bola fora de Helder. Com as devidas consequências e implicações que o governador ainda terá de enfrentar e das quais não é possível fugir.