Projeto que aumenta 18 vagas de deputado a R$ 64,6 milhões/ano é a resposta do Legislativo para evitar decisão do Judiciário, mas não resolve distorções históricas
Brasília – Em uma corrida contra o relógio e uma iminente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o Senado Federal votará na quarta-feira (25), a Proposta de Lei Complementar (PLP 177/2023) que visa aumentar o número de deputados federais de 513 para 531, adicionando 18 novas cadeiras à Câmara dos Deputados, ao custo anual de R$ 64,6 milhões ao ano. O considerável valor não inclui a despesa em cadeia que será gerada com o aumento do número de deputados estaduais e vereadores nos nove estados onde se procederá o aumento de cadeiras, num autêntico efeito dominó.
O PLP é uma resposta à exigência do Supremo Tribunal Federal (STF) para que o Congresso vote uma lei, até 30 de junho deste ano, para redistribuir a representação de deputados federais em relação a proporção da população brasileira em cada unidade da federação (UF).
O STF acatou uma ação do governo do Pará que apontou omissão do Legislativo Federal em atualizar o número de deputados de acordo com a mudança populacional. O Pará argumentou que teria direito a mais quatro deputados desde 2010. A atual distribuição dos 513 deputados federais foi definida em 1993.
O Artigo 45 da Constituição define que o número de deputados “será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta deputados”.
Em sua decisão, o STF determina que, caso o Congresso não atualize a representação parlamentar por Estado, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) poderá fixar, até 1º de outubro de 2025, o número deputados para a legislatura que começará em 2027. O Tribunal Superior Eleitoral deverá usar os dados do Censo de 2022.
Ainda no quesito aumento de despesas, municípios, estados e a atual estrutura de gabinetes dos Anexos do Congresso Nacional terão que ser ampliados para “receber” mais 18 deputados federais. A decisão desagradou a população que se manifestou contra a decisão em várias pesquisas de opinião pública divulgadas em veículos de imprensa.
A matéria já foi aprovada na Câmara dos Deputados, fruto de uma manobra que, para além das justificativas oficiais, acende o alerta sobre os impactos financeiros, políticos e sociais de uma medida que, segundo analistas, vai custar caro ao país sem resolver as distorções inerentes ao sistema eleitoral.
O apagar das luzes de junho de 2025 se aproxima, trazendo consigo um prazo-limite (30/6) imposto pelo STF, que ecoa nos corredores do Congresso Nacional. A medida, que representa do custo milionário aos cofres públicos, é mais do que um mero ajuste numérico; é um lance estratégico do Legislativo para evitar que o Judiciário assuma a definição da redistribuição de cadeiras, em um embate que expõe as tensões entre os Poderes e as complexas nuances da representatividade democrática no Brasil.
Implicações políticas e sociais
O aumento de deputados acarreta uma série de implicações que vão além da matemática orçamentária. Politicamente, a medida é um paliativo. Apesar do aumento, o projeto “não implica que a Casa Baixa representará de maneira correta o número de habitantes de cada Estado”. Ou seja, as distorções constitucionais persistem. São Paulo, por exemplo, continua com sua representação “limitada” a 70 cadeiras, apesar de sua população, enquanto estados menores continuam super-representados.
Essa expansão, embora evite perdas imediatas, consolida um modelo de representação que favorece a estabilidade das bancadas existentes em detrimento de uma proporcionalidade mais justa baseada no último Censo de 2022. Os estados que ganham cadeiras veem seu poder de barganha e influência no Congresso ampliado, potencialmente alterando dinâmicas de votação e formação de blocos políticos.
Socialmente, a aprovação de um aumento de gastos com o Legislativo, especialmente para a criação de novos cargos, tende a aprofundar a desconfiança e o desgaste da imagem da classe política junto à opinião pública. Em um contexto de desafios econômicos e clamor popular por eficiência e austeridade nos gastos públicos, a prioridade dada à ampliação de vagas parlamentares, com o argumento velado de evitar uma decisão judicial, pode ser interpretada como um ato de autoproteção corporativista, minando ainda mais a já frágil legitimidade das instituições democráticas.
Repercussão e opinião pública: o silêncio ruidoso da sociedade
O projeto não é unanimidade nem mesmo dentro do próprio Congresso. A menção de “não consenso no colégio de líderes” e a declaração de “congressistas contrários” que votarão a favor apenas para evitar a decisão do STF revelam que a própria classe política está ciente da impopularidade da medida e da fragilidade de suas justificativas.
Especialistas em ciência política criticaram a solução como um atalho que evita uma reforma profunda na distribuição de cadeiras, optando pela expansão em vez da readequação. Economistas apontam para o impacto fiscal em tempos de fragilidade econômica, questionando a prioridade de alocar recursos em novos gabinetes em vez de investimentos sociais. A sociedade civil, por sua vez, reagiu com indignação à notícia de mais gastos com parlamentares, em um momento em que demandas sociais urgentes permanecem sem resposta. A medida, portanto, é uma vitória política de curto prazo para o Congresso, mas um potencial revés na batalha pela confiança da população.

Expansão ou reconfiguração?
Caso o PLP 177/2023 seja aprovado, o Brasil terá uma Câmara dos Deputados maior e mais onerosa, sem que as distorções fundamentais de representatividade sejam resolvidas. Essa “solução” de adicionar cadeiras pode criar um precedente perigoso, incentivando futuras expansões em vez de forçar uma reforma estrutural mais justa e proporcional. A curto prazo, o Congresso evita uma intervenção direta do STF, mas a longo prazo, a questão da adequação das regras constitucionais aos dados demográficos persistirá como um nó a ser desatado, com potencial para novos litígios e tensões entre os Poderes.
Se o projeto não for aprovado até o dia 30 de junho, o STF assumirá a responsabilidade pela redistribuição das cadeiras. Este cenário poderia resultar em perdas efetivas de representação para alguns estados, o que implicaria uma reconfiguração da Câmara potencialmente mais alinhada com a realidade demográfica, mas também politicamente mais dolorosa para as bancadas afetadas. A decisão do Congresso, portanto, é uma escolha entre um paliativo custoso e a possibilidade de uma intervenção judicial que force uma mudança mais radical e, talvez, mais justa.
Pelo texto aprovado pelos deputados, nenhum estado vai perder deputados, e 9 deles ganharão entre 1 e 4 cadeiras:
• Amazonas: mais 2 deputados
• Ceará: mais 1 deputado
• Goiás: mais 1 deputado
• Minas Gerais: mais 1 deputado
• Mato Grosso: mais 2 deputados
• Pará: mais 4 deputados
• Paraná: mais 1 deputado
• Rio Grande do Norte: mais 2 deputados
• Santa Catarina: mais 4 deputados.
Reportagem: Val-André Mutran é repórter especial para o Portal Ver-o-Fato e está sediado em Brasília.