O jabuti subiu na árvore depois que a ponte caiu |
No jargão legislativo, quando um grande grupo econômico ou outro lobby político poderoso embute norma casuística num diploma legal que trata de matéria que não objetivava regramento sobre o assunto entranhado, muitas vezes motivado por alguma irregularidade, diz-se que botaram um jabuti, em alusão ao dito popular “jabuti não sobe em árvore”.
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Pois, como já publicamos aqui, no acordo entre a Procuradoria Geral do Estado (PGE) e da Biopalma, empresa da Vale, sobre a indenização dos danos causados pela derrubada da ponte sobre o Rio Moju, na chamada Alça Viária, espertamente os interesses dos elaboradores do “acordo” emprenharam o negócio com uma cláusula nociva aos interesses da sociedade, enganando até o juízo da 5ª Vara da Fazenda, que acabou homologando o acerto.
O “jabuti” prevê que o acordo dá quitação “aos danos sociais, inclusive danos materiais e danos morais coletivos”. No entanto, isso não passou despercebido pela atenção de duas associações civis. Advogado de ambas, Ismael Moraes interpôs recurso ao juiz pedindo a exclusão dos seus associados, ribeirinhos, agricultores e coletadores de açaí, dos efeitos do acordo.
Segundo Moraes, uma vez homologado por sentença, os efeitos do acordo fazem coisa julgada “erga omnes”, ou seja, contra todos aqueles incluídos nos danos sociais e coletivos previstos no quelônio sobre a árvore.
O advogado das associações que representam os atingidos pelos danos sociais, no entanto, pediu no recurso interposto que o juiz da 5ª Vara da Fazenda chamasse aos autos a subprocuradoria geral do MP. Só aí o Ministério Público, que deu parecer favorável à “ação entre amigos” da PGE e Biopalma, correu atrás do prejuízo da sociedade civil atingida.
Foi então que a subrocuradora-chefe Cândida de Jesus Ribeiro do Nascimento compareceu no processo e determinou à promotora Rosângela de Nazaré que solicite ao juiz da 5ª Vara da Fazenda para que a PGE informe o orçamento do custo dos reparos da ponte e qual o valor a ser destinado aos danos sociais.
O Ministério Público, porém, precisa acompanhar a agência de notícias do governo do Pará: o governador Helder Barbalho já anunciou aos quatro cantos que esse dinheiro é apenas para as despesas da obra. A PGE, por sua vez, também já respondeu às associações Cainquiama e Apovo: quem quiser pode entrar com seu pedido de indenização contra a Biopalma, que a quitação aos danos sociais e coletivos do acordo não “era bem isso que a PGE queria dizer”.
Depois que os procuradores do Estado roeram a corda do acerto não republicano, a Biopalma manteve-se caladinha. Diante deste ultimo evento do processo, em que o Ministério Público se tocou que foi enganado também, aguardemos os próximos capítulos dessa novela, que mostra mais uma escorregada da PGE contra os interesses da sociedade paraense.
Veja, abaixo, as duas manifestações do MP
SUBPROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA ÁREA JURÍDICO-INSTITUCIONAL PROTOCOLO No 21121/2019
INTERESSADA: DRA. ROSANGELA CHAGAS DE NAZARÉ
DESPACHO: Ciente.
Trata-se de expediente subscrito pela Dra. Rosangela Chagas de Nazaré solicitando a designação dos Promotores de Justiça, Dr. Laércio Guilhermino de Abreu, Dr. Frederico Augusto de Moraes Freire, Dr. Renato Belini de Oliveira Costa e Dra. Hygeia Valente de Souza Pinto para atuar em conjunto com a signatária nos autos da Ação Civil Pública no 0820042-79.2019.8.14.0301, em trâmite na 5ª Vara da Fazenda Pública dos Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos desta Capital.
Aduz que o objeto da demanda circunscreve a retomada da trafegabilidade no trechoda Rodovia PA-483 (Alça Viária), interditado após a colisão de uma balsa com a estrutura da ponte sobre o Rio Moju, em 06/04/2019, na altura do KM 08, inclusive com pedido de reparação material pelos gastos com a reconstrução da ponte.
Registra que os efeitos da coisa julgada no âmbito da Ação Civil Pública são erga omnes, nos termos da Lei 7.347/1985, havendo potencialidade de seu desfecho eventualmente afetar a atuação futura dos membros do Parquet, após concluídas as investigações, razão pela qual o auxílio, ora requerido, se mostra eficaz no sentido de garantir a mais ampla proteção do interesse público envolvido.
Ante o exposto, considerando os termos do expediente em epígrafe; considerando ainda o que dispõe o art. 18, inciso IX, alínea f, da Lei Complementar Estadual no 057/2006; designo os Promotores de Justiça, Dr. Laércio Guilhermino de Abreu, Dr. Frederico Augusto de Moraes Freire, Dr. Renato Belini de Oliveira Costa e Dra. Hygeia Valente de Souza Pinto para atuar em conjunto com a Dra. Rosângela Chagas de Nazaré nos autos da Ação Civil Pública no 0820042-79.2019.8.14.0301, em trâmite na 5ª Vara da Fazenda Pública dos Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos desta Capital.
Dê-se ciência aos membros acima citados. Ao DAJ para conhecimento, registro e demais providências cabíveis. Arquive-se.
Belém, 08 de maio de 2019.
CÂNDIDA DE JESUS RIBEIRO DO NASCIMENTO – Subprocuradora-Geral de Justiça, Área Jurídico-Institucional.
MM. Juiz
Ciente da sentença homologatória do acordo constante no Id 9914938. Por oportuno, requeiro a intimação do Estado do Pará para que informe: qual o valor do orçamento previsto para aplicação na efetiva reconstrução da ponte e o estimado para reparar os demais danos coletivos.
No ensejo, comunico a designação de outros membros do MP para atuar em conjunto com esta representante do Parquet nestes autos, conforme Portaria em anexo.
Belém, 15 de maio de 2019
ROSANGELA DE NAZARÉ, 5a Promotora de Justiça de Ações Constitucionais e Fazenda Pública; FREDERICO AUGUSTO DE MORAES FREIRE, 2o Promotor de Justiça de Abaetetuba; HYGEIA VALENTE DE SOUZA PINTO, 12a Promotora de Justiça de Moju; LAERCIO GUILHERMINO DE ABREU, 2o Promotor de Justiça de Barcarena; RENATO BELINI DE OLIVEIRA COSTA.
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